segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Inverno

A janela estava balançando de novo. Era o vento anunciando que o inverno estava chegando. Maravilha, o vento gelado fazia Sophia se encher de energia. Olhou no calendário, 29. Bela data.

Lavou o rosto, abriu a janela e sentiu o corpo todo se arrepiar. Um vento gelado acariciou seu rosto. O céu estava limpo, um sol tímido brilhava a leste.

Foi até a cozinha, ainda de pijamas velhos e olhos inchados e preparou seu chocolate. Sentou-se sozinha à mesa, como sempre em todas as manhãs, desde que a casa dos pais se tornou longe demais para seus desejos. Mas a solidão estranhamente não a incomodava naquele dia. Uma alegria intensa e desconhecida tomava conta de Sophia, parecia que tudo ia dar certo.

O chocolate quente acabou e Sophia olhou a caneca vazia. Ela sempre se perguntava quão únicos seriam os desenhos deixados pelos restos de chocolate dentro na caneca. Tão únicos como cada dia da vida dela. Ou não.

Sophia sentia que seus dias às vezes se repetiam, e que esta indiferença fazia com que ela se esquecesse de muitos deles. Dias iguais, pensava ela, para que gastar espaço da própria memória com eles?

Levantou da mesa e deixou-se relaxar pelo chuveiro quente. Terapia. Massagem. No corpo e na alma. Ao sair do banho, olhou pela janela e, vejam só, o dia havia nublado. Nada poderia ser mais perfeito. Sentou-se em sua escrivaninha, abriu seu diário e escreveu: hoje é o dia mais bonito e bobo da minha vida.

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Nota de Falecimento

Eu acho que hoje eu morri um pouco por dentro.
Não um falecimento patológico, médico, físico.
Foi uma morte psicológica. Um pedaço de mim se foi.

Palavras são armas certeiras que são capazes de matar.
A ferida que ainda está aberta custará a fechar.
Por mais que eu tente, o primeiro pensamento que me vem quando acordo é sempre o mesmo.

Eu acordo com a angústia que me perturba.
Eu acordo pela metade, com uma parte de mim arrancada.
Uma parte de mim morreu.

Não foi simplesmente um desmaio, um coma. Foi morte.
E dizem que a morte é a única coisa sem solução, sem volta.
É estranho procurar por si mesmo e encontrar um vazio.

Eu nunca mais serei a mesma. Hoje perdi uma parte do meu eu.
E perdi para o vazio.
Perdi pelas palavras que arrancaram de mim muitas vontades.

E que me tiraram algumas certezas.
Perdi muitas certezas de mim.
Não tenho as mesmas vontades, porque hoje não tenho a mesma capacidade.

Não sou completa.
Não sou totalmente eu.
Eu morri um pouco por dentro.

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

O sonho de Sophia

Sophia dorme sempre que se sente triste. Ela sente que se fecha os olhos e entra no mundo irresponsável, inconsequente e transcendental dos sonhos, os problemas reais se enfraquecem. Por um momento, até é verdade.

Sophia sentiu sua confiança esvair-se pelos vãos dos dedos, sentiu sua caixinha de música parar, percebeu que a bailarina que rodava, dançava e brilhava, já não brilhava mais. O brilho havia se apagado. Então Sophia dormiu.

Ela dormiu e sonhou com um lugar de céu púrpura, onde tudo era verdade, até o que não poderia ser. As nuvens eram de algodão, um coelho trazia ovos de chocolate, um bom velhinho lhe dava presentes no Natal e ninguém era mau. Absolutamente ninguém. Sophia sonhou com aquilo que acreditava, ela dormiu profundamente.

No sonho, Sophia tinha amigos que eram o que eram e pronto. A face de ninguém era capaz de alterar a verdadeira essência da pessoa. As pessoas, no mundo de Sophia, não interpretavam. Não existia mentira nem de mentirinha. Sophia era feliz, muito feliz.

Os dias eram quase sempre de sol, só chovia quando Sophia queria tomar banho de chuva. As pessoas não choravam, não existia tristeza. Sophia havia construído um castelo onde ela era uma princesa, num mundo onde todas eram princesas. E todos eram príncipes também.

O que Sophia não sabia é que, mesmo no sonho dela, onde há princesas há bruxas. E as bruxas resolveram sair para passear. Tudo mudou, desde este dia. Havia bruxas no sonho de Sophia. Ela estava sonhando com a própria realidade. Nada poderia ser tão perfeito assim. Mas Sophia não sabia, nem sabia também que dentro dela mesma estivesse toda a angústia do que vivia fora de seu sonho.

O sonho começou a se desfazer, como um algodão doce dentro da boca, que de repente ficou salgado. Num dado momento do sonho de Sophia, o céu caiu, os rios secaram, as nuvens sumiram e as máscaras caíram. Era tudo mentira. Uma bela mentira bem contada de Sophia para ela mesma.

E Sophia acordou.

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

1001

Penso que o tempo seja relativo,
assim como a distância.

De 1 quilômetro a 1000 quilômetros,
ou 1001, tanto faz.

O tempo passa quando não precisa,
e precisa quando não passa.

A distância é longa mesmo que curta,
mas é curta mesmo que longa.

E o amor é grande mesmo que longe, que perto, que demorado, que rápido.
Mesmo que tudo ou qualquer coisa, que sim ou que não, que vida ou morte.
Mesmo que 1000 ou 1 quilômetros, mesmo que 1001 quilômetros.

quinta-feira, 6 de maio de 2010

Relato de uma alma ofendida

Como compreender a mutabilidade humana? Como se adaptar? Como pensar em meio a tanta estagnação? Como proceder? Como evoluir? Como se pode ir adiante com tantos obstáculos humanos?

Eu também sou humana!

E para mim, extrapolou-se.

Não sei. Não aprendi. Não posso e não consigo compreender, suportar e infiltrar-me num meio tão intelectualmente inóspito. É contra os meus princípios de amor à vida e aos conhecimentos.

Tornou-se complicado demais. Boçalidade. Desrespeito. Escândalo. Falta. Falta de educação. Falta. Falta de raciocínio.

Cansei-me.

Cansei-me de pessoas pseudo. Pseudo-intelectuais. Pseudo-estudantes. Pseudo-conhecedores. Pseudo-sabedores. Pseudo. É pseudo demais. É falsidade demais. É tudo muito superficial. É personagem. É fazer da vida drama sem roteiro. É efemeridade. É passageiro. É bobo. Dispensável. É completamente ofensivo!

É ofensivo a quem pensa. É ofensivo a quem dá valor. É ofensivo a quem tem maturidade para. Para tudo. E não para. Não para para nada. É fácil. Assim tudo é fácil. Mas a pergunta é:

Não há outra possibilidade?

segunda-feira, 19 de abril de 2010

O que há

O que há aqui é beleza
A beleza de sentir
De poetizar o mundo
Os outros, o ser
É mais fácil embelezar
É mais fácil que entristecer
Sinto ao respirar
Que vivo
Agora
E sempre.

terça-feira, 23 de março de 2010

Lascívia

Em meio à libertinagem
A volúpia pela voz
Desejos transbordantes
Troca, arrepios, respiração

No ardor incandescente de sua circulação
Meu pulsar acelera
Como almas dependentes
Beijos, desejos, limites

O êxtase momentâneo
Acompanhado do silêncio do deleite
Os seduz loucamente
Eternos, ternos e completos.

segunda-feira, 22 de março de 2010

Entrelaços

É como se estivesse gravado em mim
O seu gosto
O seu cheiro
A sua imagem, que me vem a todo momento
Envolta em lucidez ou delírios
Lá está você
Em mim, sempre
Como se nada no mundo mais fosse necessário
Eu desejo
Como um lobo
A tua boca
Tenho sede de ti
Um impulso incontrolável de te ter, possuir
Entre desejos ardentes, a chama inapagável
Te faço parte de mim
Dois corpos em um
Um único desejo
O amor
De dois
Únicos.

terça-feira, 16 de março de 2010

Eu me lembro de você

A paixão deve renascer a cada dia.
Um amor é verdadeiro quando mesmo muito tempo depois sente-se a sensação do primeiro encontro da forma como foi. Intenso como foi.
O primeiro toque
O primeiro olhar
A troca de energias pela pele
Arrepios
Desejo
Me abrace! Me beije!
Esqueça-se do mundo... Para que um mundo inteiro se temos este amor?
Eu te amo, eu me lembro de você.

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Nuvens

Cinzas claro, escuro, médio, fosco, brilhoso e bobo.
Eu gosto assim, com vento melhor ainda.
Vento com gosto de dia nublado.
Dá vontade de chover.
Mas ela não chove.
Será que o céu secou?